Nesta parte vou focar-me nas vítimas de violência conjugal, nas mulheres que sofrem maus tratos dentro da conjugalidade (entre pessoas que vivem em situação conjugal, casadas ou não).

 

Violência contra as Mulheres: Conjugal

 

Neste tipo de situações é possível identificar um sistema, ou seja, uma dinâmica existente, um ciclo da violência conjugal.

 

Neste ciclo é possível identificar as seguintes fases:

1. Fase de Aumento da Tensão

O agressor vai expulsar as suas tensões, aquelas que ele não sabe resolver sem o recurso da violência, sobre a mulher vítima. Vai usar imensos pretextos para usar a violência, acusando-a de não executar as tarefas domésticas ou de esta ter amantes. O uso de álcool e drogas também pode facilitar essa fase.

 

1. b) Fase do Ataque Violento

O agressor maltrata fisica e/ou psicologicamente a vítima.

 

1. c) Fase do Apaziguamento

Nesta fase o agressor manifesta-se arrependido e promete não voltar a agredir. Pode evocar motivos que justificam a agressão. Pede desculpa e trata delicadamente a mulher vítima, fazendo-a acreditar que foi a ultima vez que a agrediu. Esta fase também é denominada de “lua de mel”, pois o agressor seduz a vítima.

 

Este ciclo é vivido pela vítima numa constante medo, esperança e amor. O medo motivado pelas experiências de medo, a esperança que tudo mude e o projecto de vida seja bem sucedido e amor motivado pelo amor que o agressor oferece na fase da “lua de mel”.

Estas fases são vividas com muita dor e sofrimento pela mulher vítima.

 

A Violência Conjugal

 

O problema da Violência Conjugal é comum a muitas mulheres mas isso não significa que as reacções sejam iguais, pois cada pessoa é única, com experiências de vida diferente, ainda que bastante semelhantes. A reacção ao problema é sempre uma reacção pessoal. Apesar de cada da singularidade de respostas é possível identificar um conjunto de características comuns a todas elas tais como:

  1. distúrbios cognitivos e de memoria. É frequente a vítima apresentar pesadelos, dificuldades de atenção, concentração, confusão mental, crenças erradas sobre si própria, memórias frequentes dos acontecimentos traumáticos (dos espancamentos, coacções…). Estas reacções podem levar a muitas dificuldades, nomeadamente a tomadas de decisões.
  2. Comportamentos depressivos ou de evitamento. A vítima geralmente desenvolve pensamentos pessimistas, vergonha de revelar os seus problemas a outros, encontra-se confusa, fragilidade, com sentimentos de culpa, baixa auto estima, falta de confiança no futuro e nos outros.
  3. Disturbios de ansiedade. A mulher fica desorganizada, fica hiper vigilante, com medos, fobias e ataques de ansiedade associados ao stress e à ansiedade causados pela situação de violência.

 

Atenção pois, apesar das mulheres apresentarem estas características não quer dizer que estas apresentem patologia ligada aos sintomas pois podem ser vistos como mecanismos de sobrevivência.

 

ESTRATÉGIAS DO AGRESSOR

 

No ciclo de violência conjugal, o agressor exerce sobre a vítima estratégias de domínio para ter poder sobre ela. Tais como:

  1. Exercer violência física sobre a mulher vítima. Consiste em agredir a mulher com sovas, apertar-lhe o pescoço, puxar-lhe o cabelo violentamente, bater-lhe com a cabeça contra paredes, bater com a própria cabeça na sua, empurra-la pelas escadas a baixo, dar pontapés na barriga (em alguns casos durante a gravidez), sequestra-la, tentar mata-la, não a assistir depois dos ataques…
  2. Exercer violência psicológica sobre a mulher. Geralmente o agressor grita para a aterrorizar, humilha-a com palavras e comportamentos, persegui-a na rua, no emprego, humilha-a de forma negativa sobre o seu aspecto, maltrata os seus familiares, acorda-a durante a noite, dirige-lhe insultos…
  3. Exercer violência sexual. Obriga a mulher a praticar actos sexuais contra a sua vontade. Pode ainda tortura-la sexualmente, como queimar-lhe os órgãos genitais com pontas de cigarro em brasa, amarra-la, morde-la, entre outras…
  4. Isolamento relacional. Proíbe a mulher de trabalhar, sair de casa, ter amigos, contactar os familiares…
  5. Intimidação. Mantém a mulher com muito medo do que ele possa fazer contra ela e os seus familiares.
  6. Domínio económico. Nega à mulher o acesso a bens materiais do casal, como dinheiro e satisfação de necessidades básicas. Impede a vítima de ter um emprego fora de casa ou permitir mas controla o vencimento desta.

 

Estas estratégias mantêm a mulher sempre com medo e sob o domínio.

 

Para compreender esta problemática vamos falar dos MITOS CULTURAIS.

 

O Mito aparece como conto ou expressão popular para legitimar a violência contra as mulheres, muitas vezes remetendo para a tradição de desigualdade entre sexos. São explicações distorcidas da realidade das mulheres vitimas de violência conjugal e que podem dificultar o pedido de ajuda.

 

  1. “Poucas mulheres sofrem de violência conjugal”. – A violência conjugal está presente em todas as sociedades e é sofrida por muitas mulheres.
  2. “Entre marido e mulher ninguém mete a colher” – Este género de violência é considerado crime público. Deve-se considerar como uma questão que não pode ser tolerada.
  3. Só mulheres de meios sociais desfavorecidos têm esse problema” – A violência conjugal está presente em todos os meios sociais.
  4. “Só as mulheres mais velhas levam dos maridos” – A violência conjugal está presente em todas as idades.
  5. “O marido tem o direito de bater na mulher quando ela se portar mal” – O marido não tem o direito de maltratar a mulher. A violência não pode ser tolerada enquanto resolução de conflitos.
  6. “O marido tem o direito ao corpo da mulher. Ela tem o dever de receber o marido sempre que ele quiser” – Ninguém tem o direito sobre o corpo de outrem. A mulher não tem o dever de se relacionar sexualmente com o seu marido sempre que ele o desejar, mas sim quando também ela o desejar.
  7. “Há mulheres que provocam os maridos, não admira que eles se descontrolem” – A violência conjugal não pode ser atribuída a um descontrolo por parte do agressor. A violência conjugal não deve ser tolerada, pois consiste num crime.
  8. “Têm que aguentar para não acabar com o casamento. É o destino da mulher” – O casamento só deve ser preservado quando essa relação é um projeto de vida que a faz feliz. As relações conjugais que se baseiam na violência não fazem feliz as vitimas, são experiências de vida muito traumáticas. A violência não pode ser considerada como destino da mulher, o destino pertence-lhe e deve ser ela a decidir-lo.

 

A mulher vitima de violência pode queixar-se dos crimes que contra a sua pessoa ou os seus bens tiverem sido praticados pelo ofensor. Pode apresentar queixa – crime junto às entidades competentes (Guarda Nacional Republicana, Policia de Segurança Publica, Policia Judiciária, Instituto de Medicina legal).

 

É importante a mulher vítima de violência ser acompanhada por técnicos de saúde,  nomeadamente médico e/ou psicólogo.

 

 

Violência contra as Mulheres: Sexual

 

Esta parte trata da violência sexual contra as mulheres. O sofrimento da mulher vitima desse crime não se resume ao momento desse crime. A partir daí, começa um período de grande sofrimento emocional.

 

A violência sexual não envolve apenas o uso de violência física. O/A  agressor/a pode usar técnicas para pressionar ou forçar a vitima à prática de um ato sexual.

 

A violência sexual pode consistir num conjunto de vários crimes, além daquele que for de natureza sexual (por exemplo, uma mulher pode ser vítima de violação, mas também, no contexto dessa violência, ser vitima de ofensas à integridade física, de roubo, de dano…).

 

CRIMES DA VIOLÊNCIA SEXUAL:

  • Violação. Quando alguém é forçado a manter relações sexuais com o uso de violência, ameaça grave, criação de estado de inconsciência ou impossibilidade de reação;

 

  • Coação sexual. Consiste em constranger outra pessoa – por meio de violência, ameaça grave ou depois de, para esse fim, a ter tornado inconsciente ou posto na impossibilidade de resistir – a sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, ato sexual de relevo;

 

  • Abusos sexual de pessoa incapaz de resistência – Prática de ato sexual com pessoa inconsciente ou incapaz de opor resistência, aproveitando-se do seu estado de incapacidade;

 

  • Ofensas à integridade física – Quando alguém ofende o corpo ou a saúde de outra pessoa;

 

  • Ameaça – Quando ocorre uma forma de intimidação dirigida a uma pessoa, provocando-lhe medo, inquietação ou prejuízo na sua liberdade de determinação;

 

  • Sequestro – Ato de privar outrem da sua liberdade;

 

  • Rapto – Quem pratica através da violência, ameaça ou astúcia, priva outrem da sua liberdade, tendo como objetivo a submissão da vitima a extorsão, a prática de crime contra a liberdade e a autodeterminação sexual ou a obtenção de resgate ou recompensa;

 

  • Roubo – É o ato de com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, através do uso de violência;

 

  • Dano – Consiste em destruir, total ou parcialmente, danificar, desfigurar ou tornar não utilizável coisa alheia.

 

 

 

A mulher vitima de um crime sexual enfrenta depois do acontecimento uma difícil mistura de sentimentos e de preocupação da qual será difícil libertar-se.

 

As reações da mulher vitima depois da violência sofrida parecem seguir um ciclo muito típico, podendo ser resumido em três fases, apesar do tempo de recuperação seja diferente de mulher para mulher vitima.

 

CICLO DE REAÇÃO ou RECUPERAÇÃO da crise:

  1. a Fase de Impacto. Esta fase verifica-se logo após a violência sofrida. A mulher pode culpabilizar-se. Durante o sono os pesadelos podem ser constantes. Muitas vezes pode manifestar desejo de vingança e raiva. A confusão, o medo, o desarmo, a culpa, pena de si própria e a auto desvalorização estão presentes nesta fase;

 

  1. a Fase da Recuperação. A mulher vitima começa a adaptar-se à sua realidade de vitima, a aceitar que, de facto o crime aconteceu. É frequente oscilar entre esta fase e a anterior. Com a passagem do tempo, as vacilações tendem a ser menos frequentes;

 

  1. Fase da Reorganização. Nesta ultima fase, a vitima ultrapassou os sentimentos e a desorganização iniciais, é capaz de visualizar racionalmente o crime. A mulher vitima nunca ontem a recuperação completa, as cicatrizes emocionais, e por vezes também físicas, permanecem para sempre consigo.

 

A mulher vitima de violência pode queixar-se dos crimes que contra a sua pessoa ou os seus bens tiverem sido praticados pelo ofensor. Pode apresentar queixa – crime junto às entidades competentes, como:

  • Guarda Nacional Republicana;
  • Policia de Segurança Publica;
  • Policia Judiciária;
  • Instituto de Medicina legal.

 

É importante a mulher vítima de violência ser acompanhada por técnicos de saúde, nomeadamente médico e/ou psicólogo.

 

Caso necessite de ajuda, pode contactar-me através do link em baixo.

 

Vilma Ribeiros – Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta WeCareOn

 

*Artigo adaptado do Manual alicipe. para o Atendimento de Mulheres Vítimas de Violência – APAV