Falar da morte é falar de vida, falar de luto é falar de vínculos de afetos de amor. Sem vínculos não haveria luto. Só se enluta verdadeiramente quem ama. Mas quem é amado não morre.
Tipos de luto
Há vários tipos de luto: desde os grandes lutos, às grandes perdas e a pequenos lutos (e.g. o término de um namoro).
Falar de luto é falar de vínculos. (Parkes,1996, 2006; Kübler-Ross,1969; Freud,1996; 1a Ed 1917 ). Para Freud:
O luto, de modo geral, é a reação à perda de um ente querido, à perda de alguma abstração que ocupou. O lugar de um ente querido. Em algumas pessoas/circunstâncias, as mesmas influências produzem melancolia em vez de luto; Suspeitamos de que essas pessoas possuem uma disposição patológica (Freud, 1917).
No luto normal, o amor pelo objeto não pode ser desistido… e pode ajudar a seguir em frente.
Na melancolia há uma retirada da dor para o próprio ego, o desinvestimento não é no mundo, mas em si mesmo.
Pode ser descrito também como o preço do rompimento de um vínculo. A partir do momento em que um vínculo é estabelecido, ela faz parte das nossas vivências e a sua quebra representa perda de segurança, perda de confiança (Zisook, 2009; Parkes,2006; Dias, 2002).
A vinculação afetiva é um comportamento social, que mesmo diferindo de individuo para individuo, conserva características comuns, como a fonte de segurança, confiança e proteção, sendo que a manutenção do vínculo é feita pelos dois lados da relação (Parkes, 2006).
Os seres humanos são propensos a estabelecer vínculos afetivos por sobrevivência, proteção e como resultado do comportamento social (Parkes, 2006). O amor, o apego, o ciúme, dor de perder segurança e proteção são características do vínculo.
A necessidade da sua manutenção como forma de segurança e a ameaça de perder essa fonte, ou esse “objeto” de amor, gera ansiedade, tristeza e raiva.
Todos os vínculos que uma pessoa forma com outras possuem grande envolvimento emocional (Parkes, 2006).
As experiências de infância, as relações precoces e as relações familiares, têm um papel preponderante no luto e na forma como cada um lida com a perda. O vinculo acompanha-nos do berço à cova (Bowlby, 1977).
Fases do luto segundo Kubler Ross
Fase 1– Choque/Negação
A notícia é inesperada e a pessoa não consegue (ainda) perceber o que aconteceu. A pessoa nega a noticia e/ou a realidade.
Fase 2 – Raiva
“Porquê eu?”
“Que fiz eu de mal”
“Tinha de ser comigo”
“Só a mim é que acontece?”
“Porque não acontece aos outros?”
Fase 3 – Negociação
Negociação com o destino, com as circunstâncias. “Se ele não morrer eu… ou eu…” (Se o tumor não for maligno eu deixo de fumar; se a minha filha nascer saudável eu deixo de fumar).
Fase 4 – Depressão
A pessoa apercebe-se de que a realidade da perda é irreversível e não consegue viver com isso, nada parece fazer sentido.
Fase 5 – Aceitação
Aos poucos a pessoa aceita a realidade e recomeça as suas rotinas, as suas tarefas.
Muitas vezes existem recuos e as fases nem sempre acontecem desta forma.
Por vezes há acontecimentos que levam a que haja regressões. Por exemplo, uma data um acontecimento, uma memória (Kubler Ross, 1969; 1981).
O que é o Luto?
O luto é a reação normal a uma perda. O luto em si não é patológico e ajuda a pessoa a seguir em frente.
O luto não está só associado a morte de alguém, há diferentes situações que podem ser consideradas luto tais como:
- Divórcio;
- Perda de animal de estimação;
- Mudança de emprego;
- Perda emprego;
- Doença;
- Perda de um membro, acidente;
- Mudança de cidade;
- Mudança emprego;
- Término de relação amorosa;
- Término de relação amizade;
- Afastamento de familiares e/ou amigos;
- Perda de cabelo;
- Autoimagem: ganhar peso/perder peso;
- Não engravidar;
- Nascimento de bebé prematuro;
- Sexo do bebé;
- Saúde do bebé;
- Perda de acuidade visual/auditiva/outros;
- Perde de autonomia.
William Worden, no seu livro “Grief Counseling and Grief Therapy”, relata que as reações de luto normais caem em quatro categorias gerais:
Sentimentos:
- Tristeza;
- Raiva;
- Culpa;
- Auto-censura;
- Ansiedade;
- Solidão;
- Fadiga;
- Desamparo;
- Choque;
- Libertação;
- Alívio;
- Entorpecimento.
Sensações Físicas
- Vazio no estômago;
- Aperto no peito;
- Aperto na garganta;
- Hipersensibilidade ao ruído;
- Despersonalização;
- Sensação de falta de ar;
- Fraqueza nos músculos;
- Falta de energia;
- Boca seca;
- Descrença;
- Confusão;
- Preocupação;
- Sentido da presença do falecido;
- Alucinações;
Cognições
- Descrença e confusão;
- Sentimento de presença da pessoa desaparecida;
- Alucinações (ver a pessoa que faleceu numa multidão, ouvir a sua voz).
Comportamento
- Distúrbio do sono;
- Apetite;
- Hiperatividade;
- Comportamentos distraídos;
- Retraimento social;
- Isolamento;
- Dificuldades em lidar com os bens da pessoa falecida;
- Valorizar objetos em demasia, ou o oposto, querer ver-se livre deles.
O modelo de Worden reconhece que cada pessoa e cada perda significa trabalhar com uma gama de diferentes emoções. Da tristeza, medo, solidão, desespero, desesperança e raiva, à culpa, vergonha, alívio, e inúmeros outras emoções.
A diferença entre as reações de luto normal e as de luto complicado não se distinguem pelo modo como aparecem, e sim pela sua duração, intensidade dos sintomas, do sofrimento e o prejuízo da funcionalidade (Jacobsenet al. 2010).
Luto nas Crianças
As crianças muitas vezes são marginalizadas na sua dor.
Muitas vezes os adultos tentam protegê-los contra a enormidade da perda, dizendo-lhes meias- verdades.
Alguns adultos, talvez para se proteger de ter de gerir o impacto total da tristeza numa criança, enganam-se a eles próprios, querendo acreditar que as crianças são “muito jovens” para saber o que está a acontecer.
O psicólogo infantil, Alan Wolfelt (1991), disse:
“Qualquer pessoa com idade suficiente para amar é velho o suficiente para se lamentar.”
Idades: 2-4 anos
O seu conceito de morte como reversível. Tendem a reagir orientados para o presente, procuram respostas imediatas.
Idades: 4-7 anos
Conceito de morte ainda reversível. Por vezes podem sentir sentimento de culpa por desejos e/ou ciúmes; – ( ex. ciúmes do irmão e o irmão morre).
Comportamento observável:
- Mais verbalizações;
- Grandes preocupações, “como”, “porquê”?;
- Pode comportar-se como se nada tivesse acontecido (negação);
- Stress e ansiedade geral.
Idades: 7-11 anos
Morte começa a ser vista como final e como uma punição:
- Fazem questões específicas;
- Desejo de detalhes;
- Percebem o luto e choram pela pessoa desparecida.
Idades: 11-18 anos
- Morte como uma entidade abstrata;
- Reagem com sentimentos de Depressão/Negação/Regressão/Grande procura de suporte (se a família não dá, podem procurar por a/Risco de uso de substâncias.
Cada pessoa vive o luto à sua maneira.
No fundo tudo é nascer e morrer. Fazemos lutos todos os dias.
Vilma Ribeiros – Psicóloga WeCareOn
*artigo adaptado do Curso Intensivo de Intervenção no Luto (Reconstruir – Psicologia e Desenvolvimento Pessoal)