Cada vez mais é comum ter um amigo, familiar ou conhecido que vai ou já foi à primeira consulta de psicologia, mas ainda existe um certo estigma associado a esta procura de ajuda. Infelizmente, ainda é recorrente ouvir-se dizer que para procurar a ajuda de um psicólogo é necessário ser-se “maluco”, ou por outras palavras, é preciso ter-se uma doença mental grave que impede o indivíduo de seguir com uma vida dita “normal”.

 

Outra situação comum, quando se ouve falar da consulta de psicologia, é fantasiar-se com uma sala com um divã e um senhor de cabelos brancos, sentado num cadeirão e com um bloco de notas. Embora existam profissionais que tenham tido formação para fazer esse tipo de intervenção, não é o caso da grande maioria, e esclareça-se que serão poucos os psicólogos que apresentar-se-ão com cabelos brancos, bigode e um cachimbo. Que fique claro que essas não são as caraterísticas do “kit” “Como ser um psicólogo”.

 

Neste artigo iremos falar sobre como funciona esta primeira consulta de psicologia, a quem se destina e o que pode esperar da mesma.

 

No final iremos relatar uma experiência, ficcionada, de Cátia que descreve de forma muito criativa, divertida e imaginativa como foi a sua experiência de ir a um psicólogo.

 

 

Porquê ir a um Psicólogo?

 

Qualquer pessoa, independentemente da sua idade, estatuto social ou etnia, já teve ou poderá vir a ter momentos em que sente que algo se alterou na sua vida, ou que há algo que não está bem consigo. Poderá sentir-se triste, emocionalmente exausto, ter um esgotamento emocional ou até sentir que há algo de errado e não saber o que é ou como explicar, mas que no fundo o impede de prosseguir com a sua vida como gostaria.

 

Por vezes esses momentos são passageiros, sendo apenas meros “momentos”. Todavia, noutros casos, esse mal-estar sentido em certo momento, poderá prolongar-se, parecendo sobreviver ao tempo, e começa a sentir-se como se estivesse a ser arrastado para uma trajetória descendente, em que perde a motivação para realizar atividades que antes lhe proporcionavam prazer, cada dia torna-se tão ou mais difícil que o anterior, as coisas mais simples como, por exemplo, sair da cama de manhã, parecem tarefas hercúleas, e é nessa altura que talvez seja preciso a ajuda de um profissional.

 

Este primeiro passo é uma decisão importante e um gesto louvável, visto que não só assume que algo não está bem consigo, como entende que precisa de ajuda. É importante realçar que esta decisão de procurar ajuda, tem de partir da vontade do próprio em querer modificar a sua vida, pois afinal de contas é ele o principal agente de mudança.

 

 

Será que os problemas desaparecem com o tempo e já não preciso de ir a um Psicólogo?

 

A literatura tem vindo a demonstrar que ao não tratar da sua saúde mental haverá uma maior hipótese da situação se agravar e começar a causar outros efeitos negativos como, por exemplo, começar a experienciar dificuldades nos seus relacionamentos, sentir menos disponibilidade mental/emocional para cuidar dos seus filhos, sentir-se incapaz de ir para a escola/faculdade/trabalho, e inclusivamente, ao não procurar ajuda psicológica tal poderá  levar a um maior risco de desenvolver problemas de saúde, e em situações extremas pode conduzir ao internamento num hospital ou à ideação suicida.

 

Se, ultimamente, dá por si a ter pensamentos de se suicidar ou a planear como fazê-lo, deixamos aqui a linha de apoio ao suicídio em Portugal que é a “SOS VOZ AMIGA” e poderá ligar para os seguintes números: 21 354 45 45; 91 280 26 69; 96 352 46 60.

 

Qual a vantagem de ir a um Psicólogo?

 

Existem inúmeras vantagens, a primeira é que está protegido pelo sigilo profissional, podendo falar livremente do que o preocupa ou angustia, visto que toda essa informação estará protegida pelo profissional. Outra vantagem é que o psicólogo não irá dar meros “conselhos”, como um amigo poderia fazer, ele vai escutá-lo atentamente e recorrer a determinadas técnicas terapêuticas a fim de orientá-lo para encontrar os seus “recursos mentais/emocionais” e a potencializá-los de modo a desenvolver ferramentas para ultrapassar as queixas inicialmente apresentadas. Para além disso, não são feitas críticas à sua história ou vivências, muito pelo contrário é cultivado o respeito e compreensão com vista a estabelecer uma relação assente na confiança de modo a facilitar que sejam alcançados os resultados pretendidos.

 

Quando devo procurar um Psicólogo?

 

Recomenda-se que procure um psicólogo quando a sua saúde mental afeta ou o impede de seguir a sua vida quotidiana e/ou desempenhar certas funções.  As consultas poderão ser fundamentais para aprender mais sobre o que está a sentir, o porquê de o estar a sentir e, sobretudo, para ajudá-lo a lidar com esse sentimento.

 

Para além disso também poderá procurar o apoio de um psicólogo para ajudá-lo a superar alguns dos maiores desafios da vida como, por exemplo, o luto, problemas familiares, mudanças de emprego/país e etc., dificuldades em relacionar-se com o(a) seu(sua) companheiro(a), separações, e dificuldades em lidar com os seus filhos (ex.: quando estão a passar por determinada fase do seu desenvolvimento).

 

 

Assim, a Associação Americana de Psicologia, por exemplo, sugere que é importante ponderar procurar um psicólogo sempre que algo cause angústia ou interfira com algum aspeto da sua vida, nomeadamente quando:

  • Pensar ou lidar com o problema ocupa algum tempo durante todas as semanas;
  • O problema causa vergonha a ponto de o querer esconder de outros;
  • O problema levou a que, ao longo dos últimos meses, a sua vida perdesse qualidade;
  • O problema está a interferir na sua vida de modo a ocupar, por exemplo, mais de uma hora por dia;
  • O problema afetou negativamente os seus relacionamentos, ou o seu desempenho no trabalho/escola, a ponto de reduzir o seu rendimento ou fazê-lo desistir/abdicar da sua ambição de prosseguir com a sua carreira/estudos;
  • Fez mudanças na sua vida ou desenvolveu novos hábitos para tentar lidar ou “acomodar” o problema.

 

Deste modo, ao experienciar alguma emoção ou sentimento a ponto de os mesmos interferirem com a sua vida, o acompanhamento psicológico irá ajudar a não se sentir tão controlado pelos seus sintomas, e a encontrar estratégias para que os mesmos não limitem a sua vida ou possam prejudicar a vida de outros.

Assim, deverá procurar a ajuda deste profissional sempre que:

  • Sinta apatia e que perdeu interesse em atividades que antes causam prazer;
  • Se sinta sobrecarregado(a), tendo demasiados problemas com que lidar, e não é capaz de parar ou descansar;
  • Sente necessidade de estar, predominantemente, sozinho(a), podendo sentir-se perturbado quando está com outros ou ter medo de contactar com outras pessoas;
  • Se sinta fatigado(a) e com necessidade de dormir mais do que o habitual, ou tem dificuldade em começar o seu dia;
  • Sinta desesperança, isto é, por um período prolongado tem sentido que perdeu a esperança ou motivação;
  • Sinta raiva, culpa ou ressentimento de forma desproporcional ao evento que o desencadeou e por um período prolongado;
  • Sinta-se ansioso ou a ter pensamentos recorrentes de preocupação, sendo que é comum haver algo que possa causar preocupação em determinado momento. Porém, quando essa preocupação ou ansiedade ocupa uma parte significativa do seu dia ou causa sintomas físicos (ex.: dores de barriga, aperto no peito, etc.) será importante procurar ajuda de um profissional;
  • Sinta-se impedido de sair de casa devido ao receio de voltar a experienciar ataques de ansiedade.

 

Quais são os benefícios de ir a um Psicólogo?

Existem vários benefícios de frequentar as consultas de psicologia, nomeadamente:

  • Irá aprender mais sobre si mesmo, e como “bónus”, sentir-se-á mais capacitado para agir e tomar determinadas decisões por conta própria;
  • Irá perceber como cultivar relações mais satisfatórias, independentemente de estar num relacionamento ou não, poderá aprender a superar as suas dificuldades (ex.: insegurança nas relações, dificuldade em confiar no seu parceiro, etc.) em relacionar-se com outros;
  • Irá melhorar a sua saúde, uma vez que os problemas de saúde mental que não são tratados poderão ter impacto no seu bem-estar físico;
  • Poderá obter melhorias em todas as áreas da vida, pois sempre que sente que há algo que o está a impedir de viver a vida que imagina e quer para si, o acompanhamento psicológico poderá ajudar a lidar com essa situação, adquirindo uma nova perspetiva sobre o que se está a passar, e percebendo quais são as mudanças que poderá fazer;
  • Através das consultas poderá também obter ajuda para atingir os seus objetivos pessoais, ou até descobrir ou clarificar quais são os seus objetivos, e estabelecer passos realistas para ir ao encontro dos mesmos.

 

 

Como funciona a primeira consulta de psicologia? 

 

Numa primeira consulta de psicologia, o psicólogo irá querer conhecê-lo melhor perguntando qual é a sua idade, a sua profissão, se está nalgum relacionamento, se tem filhos, se vive sozinho e entre outras que permitem ter uma imagem da sua história.

 

Eventualmente, o profissional também irá perguntar o que motivou a ir à consulta. Poderá dar-se o caso em que, aparentemente, não houve nada que justificasse o seu mal-estar atual, sendo esse o caso poderá começar por explicar exatamente isso. O profissional que está à sua frente irá ajudar a identificar e encontrar um “nome” ou as palavras que melhor descrevem aquilo que está a sentir, sem efetuar qualquer julgamento, e deixando claro que não está só.

 

Com este profissional poderá falar abertamente sobre o que o angustia ou está a causar-lhe sofrimento pois trata-se de uma pessoa que está disponível para ajudá-lo a refletir sobre estes aspetos através de outros ângulos. O(A) psicólogo(a) irá consciencializá-lo para o que pode ser trabalhado e melhorado em si, mas também ajudará a identificar as suas potencialidades.

 

Nesta primeira consulta de psicologia poderá sentir necessidade de contar, em linhas gerais, a sua história até ao momento presente. Poderá até querer falar de projetos futuros que deseja realizar, mas que no momento, por inúmeros fatores, parecem inalcançáveis. Pode e deve partilhar tudo quanto considere ser importante. Poderão ser feitas algumas perguntas para perceber um pouco melhor a sua história.

O processo terapêutico

O(A) psicólogo(a), por sua vez, irá explorar um pouco mais o pedido efetuado, de forma a compreender o melhor possível a situação e o seu mundo interno e tentará estabelecer uma relação terapêutica. Nesta consulta, poderá igualmente averiguar-se a necessidade de haver, ou não, uma avaliação psicológica, com recurso a testes psicológicos específicos para o seu pedido.

 

Para o final poderão ser pensados alguns objetivos para poderem vir a trabalhar em conjunto, podendo ficar acordado que nas próximas consultas, por exemplo, haverá espaço para o diálogo, mas também para adquirir determinadas ferramentas práticas para o dia-a-dia. É importante esclarecer que os objetivos, não apenas poderão sofrer alterações com o decorrer do tempo, como também irão variar muito de pessoa para pessoa, pois se haverá uns que apenas querem um espaço onde possam falar e expressar o que sentem, outros poderão estar à procura de algo mais prático.

 

O importante a esclarecer aqui é que o(a) psicólogo(a) não irá apresentar uma solução mágica para deixar de sentir o que tem sentido, mas antes vai disponibilizar-se para que, em conjunto,  possam construir essa “solução” que pode simplesmente passar por modificar a forma como perceciona os seus problemas e o que escolhe fazer com eles.

 

 

Qual a frequência e duração do acompanhamento psicológico?

 

Habitualmente estas consultas ocorrem uma vez por semana e duram cerca de uma hora, mas pode suceder-se o caso em que é necessário haver mais do que uma consulta por semana, tudo irá depender da problemática e necessidades de cada pessoa.

 

O tempo de duração de um acompanhamento individual varia de pessoa para pessoa. No geral pode ir de alguns meses a anos. A decisão de cessar com as consultas pode ser proposta tanto pelo indivíduo como pelo psicólogo, o importante é que a decisão seja pensada e refletida por ambos. Assim, ao sentir-se preparado para começar a pensar em terminar com o acompanhamento deverá conversar sobre isso com o profissional e, se ambos considerarem adequado, poderão começar a espaçar mais as consultas realizando-as, por exemplo, quinzenalmente, até terminarem por completo.

 

Qual a ajuda que um Psicólogo pode dar?

 

Muitas vezes pode não ser fácil nomear o que estamos a sentir, e pode sentir-se tentado a encontrar o seu próprio diagnóstico. Tal poderá levá-lo a atribuir “rótulos” a si mesmo que não correspondem à realidade, e o papel do(a) psicólogo(a) pode passar por desconstruir estas conceções e, nalguns casos, até ajudar a libertar-se do peso desses mesmos “rótulos”.

 

Este profissional também irá auxiliá-lo a tornar-se num especialista de si mesmo. Sim! É isso mesmo! Vai tornar-se num perito especializado na área do autoconhecimento. Isso permitirá que venha a conhecer as suas forças, adquirir consciência da forma como pensa sobre determinados aspetos e ser conhecedor das suas fraquezas. É sem dúvida um trabalho árduo, mas muito recompensador.

 

Imagine-se sentado diante de um espelho, um espelho onde pode ver-se, não como se idealiza ou como os outros dizem ser, mas exatamente como é, parece impossível, mas a terapia faz um pouco de “espelho” e ensina-o a ver a sua imagem da forma mais autêntica.

 

Porque é que isso é importante?

 

Porque torna-se no seu melhor aliado! Conhece as forças, mas também as fraquezas e isso permite que possa adquirir novos recursos e adequar a sua visão do mundo para algo mais próximo da realidade, em que reconhece e aceita as suas limitações, aprende a “acarinhá-las”, deixa de parte a culpa que o prende, passa a respeitar os seus limites, a não ter medo de falhar e a saber “reinventar-se” quando as coisas não correm como esperado.  É certo que não será uma cura milagrosa para todos os seus males, mas decerto será uma forma de adquirir maior consciência do que está a causar sofrimento, ensiná-lo a ver-se no “espelho” com outros olhos, a recorrer a determinados pontos de apoio para se reequilibrar sempre que necessário, e no fundo a trabalhar no sentido da autodescoberta e do crescimento pessoal.

 

Em suma….

Através do acompanhamento individual irá descobrir uma infinidade de coisas novas sobre si mesmo, e algumas até poderão surpreendê-lo ou assustá-lo, mas terá uma pessoa disposta a acompanhá-lo e guiá-lo passo a passo nessa caminhada de autodescoberta.

 

Qual é o grande objetivo? O objetivo supremo de procurar a ajuda de um(a) psicólogo(a) é o de promover a mudança que o leve a conquistar um bem-estar a longo prazo, e adquirir uma nova forma de ver os problemas com os quais já está tão familiarizado.  Embora o acompanhamento psicológico requeira honestidade, para consigo e com o psicólogo que o segue, e apesar de este ser um exercício muito difícil, o que é certo é que se estiver disposto a trabalhar, a terapia será, sem dúvida, recompensadora. É um espaço seguro e livre de críticas ou julgamentos, onde poderá partilhar tudo quanto desejar com um profissional apto a ajudá-lo.

 

É importante esclarecer também que a ida a um(a) psicólogo(a) pode não ser só para as situações em que a pessoa apresenta uma determinada perturbação mental, pode igualmente servir para adquirir maior autoconhecimento, para descobrir ou adquirir novas ferramentas que o ajudem a alcançar determinados objetivos, a ultrapassar determinada situação/fase, ou a ter relações mais satisfatórias, e em suma pode ajudar a melhorar várias áreas da sua vida.

 

Para finalizar este artigo optou-se por partilhar a história (ficcionada) de Cátia que foi a uma primeira consulta de psicologia

 

Começámos por pedir a Cátia que se apresentasse para os nossos leitores.

Cátia: Bom… O meu nome já sabem que é Cátia…. Tenho 29 anos, vivo sozinha, trabalho na área dos recursos humanos… Não sou pessoa de ter uma infinidade de amigos, mas os poucos que tenho são muito queridos. Não tenho irmãos e os meus pais vivem fora de Lisboa.

 

 

O que a motivou a ir procurar a ajuda de um psicólogo?

Cátia: Sabe…. Ultimamente tem sido difícil manter um relacionamento amoroso e o meu emprego está preso por fios. Percebi que se continuasse a não cumprir com as minhas responsabilidades candidatava-me ao desemprego.

Desde há muito tempo que a tristeza se tornou na minha melhor amiga.

Ultimamente dava por mim a pensar se já não estava na hora de seguir o conselho dos meus amigos e familiares e marcar uma consulta com um psicólogo.

Sentia que a tristeza estava a tornar-se demasiado grande para carregar ao colo e que precisava de a largar, deixar ir embora, ou lançar pela janela do 35º andar…

Qualquer uma destas soluções pareciam maravilhosas, mas…. No momento de agir sentia que faltava a força para o fazer e quando dava por mim lá estava a tristeza sentada ao meu colo mais uma vez… Por vezes, esta tristeza parecia uma criança com destreza para trepar por mim acima, colocar-se em cima dos meus ombros, e enterrar os seus calcanhares no meu peito, o que causava com que surgissem pequenas lágrimas involuntárias. Como mais ninguém via esta criança rebelde e atrevida, ninguém compreendia o porquê de estar a chorar tão subitamente. Com o tempo aprendi a disfarçar e engolir esta dor, descobri que podia camuflar dizendo que eram apenas “alergias” e mais ninguém colocaria questões.

Mas o que é certo é que tudo isto não passava de uma encenação, e cada vez mais estava difícil manter esta máscara de “está tudo bem”. A situação estava a tornar-se insuportável e estava na altura de pedir ajuda de um profissional, sobretudo porque comecei a ser menos produtiva no meu trabalho e a última coisa que precisava era de ir (mais a minha tristeza) fazer fila para a porta do centro de emprego mais próximo.

Como se sentiu ao início?

Cátia: Sentia-me nervosa… Não sabia o que dizer, mas sabia que precisava de dizer algo. Estava muito reticente… O Francisco, o meu psicólogo, foi muito simpático, descreveria como uma pessoa muito humana e observadora. Respeitou as minhas dúvidas, perguntou algumas coisas e reparei que embora eu dissesse que considerava toda esta situação que tenho vivido como “estúpida, pois há pessoas em situações muito piores”, ele não rotulava esta minha vivência da mesma forma. Senti que viver esta tristeza era uma experiência tão válida como qualquer outra e não me senti julgada nem criticada…. Foi estranho… Mas num bom sentido, porque acabou por ser até reconfortante… A partir do momento que me apercebi disso senti que estava mais disposta a falar e cooperar, o Francisco era o meu aliado nesta empreitada.

 

Como descreveria a sua experiência?

Cátia: Curiosamente tenho refletido bastante sobre isso, pois é algo que muitos amigos me têm perguntado…. Metaforicamente falando vou tentar responder à sua pergunta.

Começo por descrever a minha mente como uma espécie de “casa mental”, e para mim é como se essa casa estivesse degradada e situada algures num bairro problemático…. É uma imagem forte, mas é exatamente como me sinto…. Existem mentes ricas e organizadas, cuja construção é milimetricamente pensada, e que têm “manutenção” regular, essas podemos situar numa zona boa tipo Avenida ou assim. A minha casa mental considero que está num bairro em que as construções são todas feitas sem qualquer cuidado e tudo ao monte, já há muito tempo que não tem manutenção, mas está devidamente mobilada, é “rica” nesse sentido e noutros que já vou falar.

 

A minha experiência

Então basicamente a minha experiência foi como se um homem detentor de uma dessas “casas” da Avenida viesse visitar a minha humilde residência. Depois de alguma reticência convidei-o a conhecer a minha “casa mental”. Por fora já sabem, mas por dentro descreveria como estando muito “cheia”, com uma mobília velha, tapetes gastos e umas paredes sem cor.

 

Uma vez dentro da “casa mental” apresentei-o aos seus habitantes. Fomos para a sala conversar e lá havia vários sofás com uma disposição em “U”. No sofá da esquerda, de dois lugares, estava sentado um monstro com quatro cabeças que fez sinal para me sentar ao seu lado. O Francisco sentou-se no sofá do meio, deixando o da direita livre. A muito custo sentei-me ao lado do monstro gordo. Mal me sentei uma das cabeças do monstro apoiou-se no meu ombro, e o seu peso fez-me curvar ligeiramente.

 

 

“Empata”

Apresentei ao Francisco o meu monstro, o qual chamei de “Empata”. A primeira cabeça, a que estava apoiada no meu ombro era a tristeza, que é aquele tipo de amiga que se cola a nós e não nos larga, tipo pastilha elástica na sola do sapato. A segunda é o desânimo, é um ladrãozito que me rouba a vontade para fazer as coisas. Ao seu lado está a falta de interesse, ou seja, mesmo quando consigo que o desânimo, não roube por completo a minha vontade para fazer o que quer que seja, vem esta desgraçada e tira-me o prazer de tudo aquilo que antes gostava de fazer, tem o dom de conseguir estragar todos esses momentos…

Sabe, parece que tira as cores e o gosto bom dessas experiências, tornando tudo cinzento e com sabor a nada. A última que está quase a adormecer é o cansaço, só de a ver fico com as pálpebras pesadas como chumbo. A bela adormecida devia ter um monstro destes na sua “casa mental”.

O Francisco considerou o nome “Empata” muito adequado. De facto, também tinha de concordar porque o monstro é grande, pesado e não me deixa seguir com a minha vida.

O Francisco pediu-me para falar um pouco sobre a nossa história, e há quanto tempo o “Empata” andava a dificultar a minha vida.

Contei-lhe em linhas gerais que nem sempre o Empata teve este tamanho. A primeira vez que apareceu, eu ainda era bem pequenina, e o Empata só tinha uma cabeça, que era a tristeza, surgiu logo após a minha mãe sair de casa…

O Francisco sendo o curioso que é, quis saber, nessa altura, como procedi relativamente à tristeza.

Responder às suas perguntas nem sempre foi fácil, mas sentia que a honestidade e franqueza seriam as minhas melhores aliadas nesta empreitada, portanto, respirei fundo e respondi dizendo que primeiro fugia da tristeza… Porque me fazia chorar e era uma companhia sufocante. Depois o meu pai disse-me que tinha de parar de chorar porque não era nenhum bebé e então reuni todas as minhas forças e empurrei-a para dentro do primeiro armário que consegui encontrar…. Mas…. Ela arranjava sempre forma de sair…. Era só uma questão de tempo… Até que começaram a crescer as outras cabeças, o cansaço, por exemplo, veio na adolescência e as outras duas, só mais recentemente. Mesmo que não as alimente elas crescem sozinhas e engordam a olhos vistos.

O Francisco ouviu atentamente e parecia mostrar uma compreensão silenciosa, aquele tipo de compreensão que se transmite apenas a partir do olhar. Confesso ter pensado se, na sua “casa mental” na Avenida não teria aprendido a lidar com o seu próprio Empata. Admito que só essa fantasia foi suficiente para nascerem uns rebentos de esperança no meu peito.

 

Uma visita guiada

Com o desenrolar da conversa senti que deveria fazer uma visita guiada pela minha “casa mental”. Claro que foi o Francisco, eu e o Empata. A tristeza apoiou a sua cabeça no meu ombro acabando por fazer com que me curvasse. O Francisco observou esta estranha relação e eu disse, em tom de brincadeira, que a minha tristeza precisava muito de mim…. Era muito carente de atenção….

O Francisco ponderou com o seu olhar muito pensativo e humano até que disse: Ou talvez te tenhas habituado à sua presença e já não saibas viver sem ela. Esta resposta apanhou-me de surpresa, e refleti sobre ela durante bastante tempo, e sabe… De facto, já não conseguia imaginar a minha vida sem a constante e intensa presença da tristeza.

A minha “casa mental” embora velha e degradada é grande, desculpei-me pela infiltração no teto e pelas coisas desarrumadas, e o Francisco não fez quaisquer julgamentos, parecendo disposto a continuar.

Passámos por uma coletânea de objetos e marcos da minha vida, expostos em quadros com fortes pinturas, o Francisco prestou atenção a cada um e simplesmente perguntou: Porque é que faz questão de guardar estes objetos e estas lembranças? Pensei para comigo: Porque não guardá-los? Afinal de contas foram-me oferecidos…. Acabei por responder isso mesmo.

O Francisco disse que a tonalidade emocional das minhas vivências mais marcantes (que gosto de pensar que estão expostos na minha “casa mental” como quadros) tinha uma forte contribuição da tristeza. Devo dizer que não podia discordar. Mas questiono-me sobre o que acontecerá à minha “casa mental” se começar a deixar de ver a vida através do olhar e perspetiva da tristeza. Contudo escolhi prosseguir, essa questão ficará para outra altura.

Passámos pelo “quarto” da infância, depois da adolescência e da idade adulta. Às vezes lembrava-me de coisas que queria mostrar e que estavam no “quarto” da idade adulta e lá íamos. E depois lembrava-me de outra que estava no da infância e, portanto, embora tentasse, não foi uma apresentação assim muito linear, mas o Francisco não pareceu incomodado com isso. De vez em quando repetia a ordem de alguns eventos, só para ter a certeza de que tinha percebido bem e pouco mais.

Na minha “casa mental”, também habitam umas algumas criaturas pequeninas que se assemelham a uma espécie de elfos ajudantes. Estes mini-elfos é como descrevo as minhas “forças” e ferramentas para lidar com as situações adversas. O Francisco achou curioso atribuir-lhes este tamanho. Encolhi os ombros não atribuindo relevância a isso, e apresentei os que melhor conheço. Isto é, o mini-elfo da criatividade, o da gratidão, o da amabilidade, o do humor, o da responsabilidade, e dois novos que pareciam ter surgido durante aquela hora e aos quais chamei de esperança e coragem.

Estes novos “ajudantes” pareciam dar-me uma certa força e consegui corrigir ligeiramente a minha postura.

 

 

Chegamos ao fim

A certa altura o Francisco referiu que estávamos a chegar ao fim. Senti que o tempo passou demasiado depressa, e ainda havia muito por falar, muitas divisões por apresentar. Embora não considere que a minha “casa mental” tenha as melhores condições posso dizer que ela é espaçosa. O Francisco assegurou que, se assim quisesse, não faltariam oportunidades para apresentar todos os cantos e recantos.

O Francisco referiu também que hoje havia dado um grande passo, fui procurar ajuda e deixei que me ajudassem.

Desculpei-me por trazer uma situação tão complicada e pela desorganização da minha “casa mental”.

O Francisco contestou, disse que tinha uma ótima “casa mental”, com boas fundações, divisões bem definidas, com muitas competências e capacidades. Estava realmente um pouco cheia, precisava de alguns consertos e faltava-lhe cor, mas não era nada que não consigamos resolver. O Empata está muito bem identificado, e temos várias ferramentas/ajudantes dispostos a ajudar a tornar este espaço mental num palacete.

Agradeci, não podia estar mais grata pela esperança que me deu.

No final fiquei com um trabalho de casa. Imagine-se! Já não tinha disto há anos (sorri). Pediu-me para pensar o que gostaria de trabalhar nesta nossa hora. Afinal de contas não era nada de especial e aceitei.

Despedi-me e disse que estava entusiasmada pela próxima visita à minha “casa mental”.

 

Como se sentiu no fim?

Cátia: Como se finalmente estivesse a ver uma luz ao fundo do túnel. Senti-me bem! Nunca imaginei que pudesse ser tão bom partilhar com alguém sobre a existência do meu Empata, só lamento não ter procurado ajuda mais cedo. Sentia-me cansada de batalhar sozinha contra o meu Empata, até que desisti… Agora parece que estou novamente pronta! Talvez já não vá “batalhar” contra o Empata, se calhar agora irei aprender como fazer as pazes com ele.

 

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Maria Ferreira – Psicóloga WeCareOn

 

Referências:

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Teixeira, J. A. C. (2010). Introdução à psicopatologia geral. Lisboa: Edições ISPA.