Quando pensamos em terra a tremer pensamos em Lisboa em 1755, pensamos no tsunami na Indonésia em 2004, pensamos em todas as notícias, imagens e relatos de sítios onde a terra treme só um bocadinho ou treme tanto que destrói tudo. Pensamos em algo bem longe, bem distante da nossa vida.
Nunca pensamos que a nossa terra pode tremer, que o nosso mundo pode mexer.
Mas será que podemos sentir o chão por baixo dos nossos pés a tremer?
Será que a nossa terra também treme?
A nossa terra
Desde o momento em que um espermatozóide encontra um óvulo, começa todo um mundo a ser construído. Um mundo de expectativas, de sonhos, desejos, angústias, sonhos, esperas, inseguranças, receios, ilusões e desilusões. Todo um mundo a preparar-se para a nossa chegada.
É desde o momento em que saímos de dentro da barriga da mãe que este mundo é o que nos sustem. É o mundo onde enraizamos, nos enraizamos. Um mundo de mãe, pai, irmãos, avós, família alargada, amigos, vizinhos, educadores, cheiros, luzes e sons. Todo um mundo que nos alimenta, nos dá o que precisamos, que nos sustém e nos permite crescer. E é assim que vamos crescendo, com mais ou menos alimento, mais ou menos estrutura, mais ou menos terra, mais ou menos segurança, mais ou menos espaço, mais ou menos ar. Vamos conhecendo e construindo o nosso mundo. Uma construção com intempéries, mudanças de estação, tempos de seca e excessos. Um mundo em construção. Um crescimento.
Neste crescer, como em todos os processos temos obstáculos, desafios, lutas
Intempéries que, por muitas vezes que se ouça a “vida é difícil“ as palavras não chegam e nunca ficam. Não nos ecoam e chegam sem aviso. Chegam e fazem o que têm a fazer. São choros de bébé não confortados, são pais que não nos veem e não nos ouvem, são crianças que nos chamam nomes e não querem brincar connosco, são mudanças pubertárias demasiado rápidas, são namoros adolescentes que terminam abruptamente, são baixos desempenhos escolares, são amizades que não funcionam e relações que acabam, são pessoas que se perdem, empregos inseguros, desempregos e dividas, são caminhos que parecem não ter direção nem saída. São “coisas da vida” como muitas vezes dizem as pessoas mais sábias.
E quando estas coisas da vida chegam à nossa vida, o que fazemos?
Pisar em terra firme
Muitas vezes me cruzo com pessoas que questionam “Mas o que quer que eu faça? Eu não tenho culpa! O mundo é que está assim.” É uma boa questão. Uma importante reflexão. Quando os empregos são instáveis, quando as relações são fugazes, quando as doenças batem à porta, quando nós e o nosso mundo se tornam vulneráveis, o que posso fazer?
Fica muito difícil saber o que fazer. Fica difícil quando nada é certo. Fica difícil não desabar. Fica difícil ficar seguro quando a terra treme.
E muitas vezes é assim que as pessoas me procuram. Sentem-se em risco de desabar ou já desabaram… O que fazer?
Quando à volta parece que não há onde agarrar então acho que é importante olhar para dentro. Agarrar o dentro. Permitir ancorar um Eu. É um caminho difícil, confuso e desesperante, tantas vezes solitário. É um caminho de procura por uma tranquilidade e serenidade num mundo tão imprevisível.
Mas como Ken Robinson uma vez disse a “imprevisibilidade é do mais extraordinário que na vida existe. Temos é de estar preparados para ela.”
E o meu papel enquanto psicóloga? Fico aqui como uma âncora que não deixa o barco andar à deriva, como um pedaço de terra seguro que num momento há-de fazer alguém gritar “Terra à vista!”
Por Susana Pereira, psicóloga @ WeCareOn