Antes de se aventurar a ler este artigo, peço-lhe que faça uma pequena reflexão, para ver se se identifica com alguma destas situações, pois podemos estar perante uma Perturbação Obsessivo-Compulsiva:

– Tem tendência a preocupar-se excessivamente e não consegue afastar, nem por nada, os seus pensamentos “maus”?

– Preocupa-se demasiado com o que está fora do seu controlo?

– Passa grande parte do seu dia a verificar se trancou bem as portas, se desligou todas as luzes, se não se esqueceu de nada (i.e., do fogão ligado, do ferro aceso, ou outros)?

– Se olhar à sua volta consegue reparar que tem vindo a acumular uma imensidão de coisas com a desculpa de que “poderá vir a ser necessário no futuro”?

– Precisa de ter tudo à sua volta organizado de uma determinada maneira para se sentir confortável e em controlo? Fica chateado e aborrecido quando as coisas à sua volta não estão perfeitas e não lhe dão a sensação do “just right”?

– Tem pensamentos violentos ou bizarros ou assustadores indesejados ou teme vir a fazer mal a alguém que lhe é próximo?

– Preocupa-se constantemente com o que poderá vir a acontecer consigo ou com os que ama? Sente que é impossível não pensar nisto, por muito que se esforce?

 

A grande maioria das pessoas experiencia um grau moderado de preocupações no dia-a-dia, pois todos lidamos com imprevistos, com base no feedback e no reforço, entre outras coisas. Portanto, acho que percebemos e sentimos o quão desagradável é estar preocupado.

 

Mas afinal, o que é a Perturbação Obsessivo-Compulsiva?

A Perturbação Obsessivo-Compulsiva é considerada uma Perturbação de Ansiedade e o diagnóstico é feito por um profissional de saúde da área da psiquiatria ou da psicologia.

Com simplicidade e sem nos perdermos em termos científicos, a preocupação e a dúvida alimentam-se de pensamentos que provocam desconforto e ansiedade. No entanto, se não estivermos perante uma Perturbação Obsessivo-Compulsiva, as preocupações vão-se alterando de dia para dia. Ou seja, é comum saltarmos de uma preocupação para outra, dependendo do nosso dia-a-dia.

Por outro lado, as obsessões são preocupações relativamente estáveis. Neste caso, estamos perante pensamentos, imagens ou impulsos que se repetem vezes e vezes sem conta, causando à pessoa um grande desconforto, medo e uma dose gigante de ansiedade. A pessoa permanece alerta e hipervigilante, sem conseguir sossegar o ruido da própria mente.

Relativamente às obsessões, o conteúdo que as sustenta pode variar de pessoa para pessoa: o medo de vir a ficar doente, pensamentos violentos ou sexuais indesejados, o medo de deixar o fogão acesso ou a porta destrancada e como consequência a antecipação de consequências desastrosas, entre outros.

Posto isto, e volto a salientar que o desconforto causado pelas obsessões é descomunal, não é surpresa nenhuma que a maioria das pessoas procure aliviar toda a sua inquietação interna de alguma forma. É desta forma que surgem as compulsões, no entanto o alivio que as compulsões admitem é apenas temporário. A ideia por detrás da compulsão ou do ritual é a de prevenir que terríveis consequências se venham a tornar realidade.

Dito isto, quando falamos em compulsões estamos, na verdade, a falar de atos mentais (i.e., orar, contar mentalmente ou repetir palavras em silêncio) ou de rituais ou comportamentos persistentes e repetitivos (i.e., lavar as mãos repetidamente, ordenar ou verificar objetos). As compulsões são difíceis de resistir e a explicação para esta realidade é simples: foi a única forma que a pessoa encontrou até agora de controlar as suas preocupações excessivas e que causam elevados níveis de ansiedade. Se estivermos a ser sinceros, ninguém consegue estar 24 sob 24 horas com níveis de ansiedade que são de bradar aos céus. Talvez, esta seja a sua realidade. Portanto, quando as obsessões começam a criar um ruído ensurdecedor na sua cabeça, existe a necessidade de realizar a compulsão, quase como se sentisse realmente um formigueiro dentro de si.

Em jeito de conclusão: as obsessões são os pensamentos, imagens ou impulsos que causam elevados níveis de stress e de ansiedade e as compulsões são qualquer ação ou pensamento que procura reduzir esse stress, temporariamente.

 

Se prefere ter uma imagem que simplifique toda esta explicação mais teórica, eu também pensei nisso:

Partilho também uma lista de pensamentos e ações que podem estar a estimular o retorno das obsessões:

– se tem medo das suas obsessões.

– se luta ativamente contra as obsessões.

– se se esforça para evitar qualquer situação que possa trazer as obsessões ao de cima.

– se estabeleceu como meta “nunca mais” ter obsessões.

– se se preocupa com a próxima vez em que terá uma obsessão.

 

Cada uma destas ações convida os seus pensamentos de medo a retornarem, criando uma tensão dinâmica entre si e suas obsessões.

 

E agora a chave de ouro: como começar a quebrar o ciclo da Perturbação Obsessivo-Compulsiva?

Primeiro, tem de acreditar que tem o direito de se sentir bem e de se sentir confortável na sua própria pele. Os sintomas da Perturbação Obsessivo-Compulsiva geram uma angustia muito grande, sentimentos de culpa e de vergonha, bem como um enorme desespero.

Já deu por si a questionar-se: “Mas afinal o que é que se passa de errado comigo?”? Estou aqui para lhe dizer que é uma pessoa incrível, lutadora e resiliente, merecedora de sucesso e de bem-estar. Sim, merece o tão desejado conforto e paz interior.

Comece devagarinho, um passo de cada vez. Não queira correr já em direção à meta! Tal como um bebé não aprende a andar da noite para o dia, é igualmente impossível que você aprenda a lidar com as suas obsessões com o estalar dos dedos. Seja paciente.

 

Em segundo lugar, comece a aceitar que as dúvidas e as preocupações que tem são irracionais. É verdade que as obsessões conseguiram ganhar tanto terreno e têm agora tanto poder que se sente mesmo pequenino e sem forças ao pé das obsessões, mas isto pode mudar.

Neste momento, ainda acredita nas ameaças que as obsessões apresentam que é difícil distinguir o pensamento da realidade. Foram muitos anos com as mesmas verdades, com as mesmas dúvidas. As novas verdades têm de ser trazidas com consistência: tem de ir à procura do oposto à sua atual crença, de se obrigar a mudar o discurso interno, mas não só, as suas ações precisam de ser congruentes com o novo discurso interno.

Comece a dizer a si mesmo que as preocupações obsessivas são muitíssimo exageradas e distorcem completamente a realidade. Esta tem de ser a sua nova verdade absoluta. No entanto, é, igualmente importante ficar a saber que os pensamentos e os impulsos obsessivos não o definem enquanto pessoa.

 

Em terceiro lugar, é importante perceber que as compulsões não são a única forma de reduzir o desconforto e a ansiedade sentida.

 

Por último, mas não menos importante, experimente aceitar as obsessões em vez de lhes resistir, de lutar contra elas ou de as tentar evitar a todo o custo. Compreendo que este seja um desafio difícil e assustador. Quando lhe peço para aceitar as suas obsessões, com isto não lhe estou a dizer que irá perder o controlo ou desejar ceder a todos os seus impulsos. Estou apenas a pedir-lhe que deixe de lutar tão arduamente e a explicação é relativamente simples. Imagine-se com um bebé pequeno ou com uma criança pequena e traquinas: quando o bebé começa a chorar, se o ignorarmos ele vai insistir e continuar a chorar cada vez mais alto… Com os nossos pensamentos acontece o mesmo, se os ignorarmos eles não desaparecem, por isso precisamos de aprender a dar-lhes, apenas, a atenção necessária, nem mais, nem menos.

Quando os pensamentos obsessivos e indesejados aparecerem, diga-lhes olá, cumprimente-os. Sim, leu bem! “Lá estás tu minha pestezinha a vir de mansinho para me tentares virar o dia do avesso”. Em vez de lutar, reconheça o aparecimento das obsessões e depois questione-se: “Posso olhar para a situação de forma diferente?”

 

Este processo não tem de ser solitário. Pode pedir ajuda e eu, caro leitor, desafio-o a fazê-lo. Será uma caminhada a dois, sem juízo ou julgamento, com base no respeito, no conforto e sempre, repito, sempre, ao seu ritmo.

 

Despeço-me de si com uma frase da Jana Kingsford que me inspira diariamente: “O equilibro não é algo que se encontra. É algo que se cria: todos os dias!”

 

Bibliografia:

Cordioli, A. V., de Souza Vivan, A., & Braga, D. T. (2016). Vencendo o Transtorno Obsessivo-Compulsivo-: Manual de Terapia Cognitivo-Comportamental para Pacientes e Terapeutas. Artmed Editora.

Foa, E. B., & Wilson, R. (2009). Stop obsessing!: How to overcome your obsessions and compulsions. Bantam.

 

 

Filipa Cruz – Psicóloga Clínica, Membro da Ordem dos Psicólogos Portugueses