Estar a passar por uma crise da humanidade, hoje com o Covid-19, com a pandemia, como há já muito não havia memória, é desafiador e tudo menos fácil. Não adianta negar isto, nem romantizá-lo. Para lá das 1001 coisas que seria suposto fazer ou dos vídeos divertidos na internet sobre o dia-a-dia em isolamento social, a verdade é que para muitas pessoas é difícil ficar fechado em casa, com ou sem crianças.

 

Não, a quarentena não é só uma questão de “aceitar” e aproveitar para passar mais tempo com a família. Para muitas pessoas isto tem um efeito perturbador e negativo e o impacto do medo, mesmo depois da situação aguda da pandemia passar, permanecerá dentro de muitas pessoas, sob a forma de somatizações, stress pós-traumático ou de qualquer outro tipo de perturbação da ansiedade.

 

A mentalidade “excessivamente” positiva, sem passar pelo deserto, é falsa e temporária (excepto para aqueles que vivem numa constante “positividade“ artificial ou têm problemas com empatia, em que a negação é apenas uma outra forma).

 

A boa notícia é que os desertos também serão abandonados. Podemos ficar presos no medo, na raiva ou na negação, mas a maioria das pessoas – quando (e se) ultrapassa estas fases – mais cedo ou mais tarde, consegue superar a tristeza.

 

Quando estamos com medo não é fácil ter vontade de brincar ou de jogar, nem sequer de pensar em que é que haveremos de fazer para o jantar. Porque o medo activa as partes mais primitivas do nosso cérebro que fazem com que nos preocupemos apenas com a sobrevivência. Por isso é natural que sintamos que não há muito espaço dentro de nós para mais nada.

 

Quando ficamos em alerta desligamos o cortéx-pré-frontal a parte do cérebro que nos permite, pensar, analisar e avaliar as situações com alguma distância. O medo liga as partes mais primitivas por isso também é muito mais fácil gritar e ficarmos zangados quando estamos com medo, porque o nosso organismo já está em estado de alerta e qualquer coisinha irá servir para acentuar ainda mais esse estado.

 

 

Sim, temos de ser fortes enquanto seres humanos. Mas justo por conta disso também somos vulneráveis.

 

Não é preciso fingirmos sermos fortes o tempo todo, ou erguer uma fortaleza com pés de barro. Isso na maioria das vezes traduz-se apenas na negação ou na repressão de certas emoções (mais difíceis), neste momento tão válidas e úteis quanto as outras.

 

O problema não é sentir. O problema é “bloquear-nos” a nós mesmos de o fazer na “esperança” que com isso o desconforto (natural) que uma situação destas pode provocar “magicamente” vá desaparecer. Não são as emoções que são “boas” ou “más”; o que pode ser “melhor” ou “pior” é como lidamos com elas e o que fazemos com as nossas emoções.

 

No dia de hoje, a minha pergunta para si é esta:

 

– Você conhece a sua mente QUANDO ela não “funciona” bem?

 

Quando uma pessoa sabe como a sua mente funciona quando não está bem, ela pode prevenir-se, saber quando está a chegar ao seu limite, quando deve pedir ajuda.

 

Então…

 

– Você reconhece-se quando não está bem?

– Que limites você coloca quando percebe que o seu estado emocional está negativo?

– Que acções ou atitudes mais propícias à manutenção da sua saúde emocional você implementa sempre que sente que o seu equilíbrio pessoal está em risco?

 

Seja em relação à permanente exposição mediática, seja em relação ao convívio com as pessoas com quem habita, seja em relação às incertezas e angústias relativas ao emprego e à insegurança económica que esta crise também gera?

Talvez o que precisamos de aceitar é que neste momento há objectivos, planos e projectos que talvez fiquem para trás (ou pelo menos, em suspenso). Que talvez as crianças vejam mais horas de televisão do que as que seriam recomendáveis, que talvez o nosso humor esteja a oscilar em catadupa, que talvez não tenhamos vontade de fazer todos os dias as refeições nutritivas e a actividade física que desejávamos fazer e que, mesmo passando muito tempo juntos, talvez não tenhamos assim tanta capacidade de descontrair, ou vontade de brincar e de jogar como pensamos que deveríamos ter.

 

 

Num momento como este, é fundamental termos esperança e estarmos convictos de que tudo irá correr da melhor forma. Porém, acredito que para correr da melhor forma a primeira coisa que precisamos fazer é mesmo aceitar que isto tudo, por enquanto, está longe de estar “normal”, ideal e perfeito, mas que continuando a fazer a parte que toca a cada um (e no entretanto, manter os cuidados de higienização física e – e !! – psicológica) seguramente #VamosTodosFicarBem 🌈

Saiba mais sobre o COVID e como está a afectar a saúde mental aqui.

 

Eu e equipa WeCareOn estamos cá para ajudar, se assim entender.

Sara Ferreira – Psicóloga, Psicoterapeuta, Membro Efectivo da Ordem dos Psicólogos Portugueses