A capacidade de dirigir e manter a atenção é fundamental nas nossas vidas – é ela que nos permite trabalhar, acompanhar o fio da conversa com um amigo nosso, ler um capítulo de um livro ou acompanhar um filme do início ao fim. Infelizmente, esta capacidade, que todos temos, pode estar perturbada em determinadas alturas das nossas vidas, pelos mais variados motivos.

Assim, neste artigo, o nosso psiquiatra e psicoterapeuta Fábio Monteiro da Silva ajuda-o a perceber as várias causas de problemas de atenção e concentração.

 

Como se manifestam os problemas de atenção e concentração?

As manifestações mais frequentes de problemas de atenção e concentração incluem aparentes “esquecimentos”. Isto é, não saber onde deixou as chaves de casa ou o telemóvel, esquecer-se do que ia dizer a meio de uma conversa, esquecer-se do que ia buscar à cozinha assim que lá chegou, esquecer-se de compromissos e tarefas, etc. Além disso, pode manifestar-se através de uma dificuldade em manter o foco no mesmo estímulo durante o tempo necessário. Por exemplo, atentar ao sentido de um parágrafo inteiro, ouvir uma conversa do início ao fim, acompanhar a trama de um filme do início ao fim, etc.

 

Isso acontece porque a mente, durante estas tarefas, está desfocada, ao invés de estar centrada no que se está a passar a cada momento, no aqui e agora. Portanto, são vários os fatores que podem contribuir para esta ausência de foco – descubra quais na próxima secção.

 

O que pode causar problemas de atenção e concentração?

 

– Depressão: Segundo a Organização Mundial de Saúde, os sintomas centrais dos episódios depressivos incluem humor persistentemente triste ou “em baixo”, cansaço ou falta de energia vital e diminuição ou incapacidade total de sentir prazer com as coisas que habitualmente eram fonte de alegria e vitalidade. Todas as pessoas com depressão têm pelo menos dois destes sintomas centrais. Além deles, há outros sintomas, igualmente importantes, mas que não estão invariavelmente presentes – são considerados os sintomas acessórios. Os problemas cognitivos estão entre os sintomas acessórios. Ou seja, várias pessoas têm estes problemas, mas não são obrigatórios para o diagnóstico. Outros sintomas acessórios incluem alteração do sono, alteração do apetite, ideias de menos-valia, ideação suicida, culpa excessiva, etc.

Na depressão, é frequente a pessoa sentir que o pensamento está mais lento que o normal, que é mais difícil processar a informação. Pode ainda sentir que a mente está perdida em pensamentos negativos em relação ao próprio, ao mundo e ao futuro. Fruto deste estado, torna-se mais difícil o foco na vida que decorre no aqui e agora. (Para descobrir mais sobre depressão, clique aqui)

 

– Ansiedade: Existem várias perturbações de ansiedade diferentes (perturbação de pânico, perturbação de ansiedade generalizada, fobia social, entre outras). Em todas elas, o corpo fica em estado de alerta constante, esperando o pior, e a mente fica assoberbada com preocupações e hipóteses sem fim (“Será que…? E se…?”). Além de este estado, por si mesmo, desviar a atenção do aqui e agora, ao longo do tempo pode causar exaustão física e mental. Com a exaustão, surgem mais problemas cognitivos. Atualmente sabe-se que estados ansiosos prolongados estão associados a uma diminuição do volume do hipocampo, uma área cerebral fundamental para a memória e outros processos cognitivos. (Saiba mais sobre ansiedade aqui)

 

– Problemas de sono: Os problemas de sono são frequentes na população portuguesa. Em parte devido a uma cultura instalada de medidas de higiene do sono muito precárias (deitar tarde, não dormir o número de horas suficientes, usar gadgets antes de adormecer, etc.). Um sono insuficiente ou não reparador pode causar cansaço durante o dia, hipersonolência diurna, alterações do humor (irritabilidade, ansiedade e depressão) e, claro, problemas cognitivos. Um cérebro cansado é um cérebro que não consegue estar presente e atento, assim como processar informação e aprender informação nova.

 

– Stress: O stress é um estado de tensão mental e emocional causado por exigências externas. Por vezes, essas exigências, por exemplo no trabalho ou na vida familiar, são maiores do que aquelas que a pessoa pode suporte. Nesse caso, não é possível dar resposta a tudo o que é pedido, simplesmente porque o que é pedido é demasiado! O estado de esgotamento decorrente acompanha-se tipicamente de queixas cognitivas – desatenção, falhas de memória, etc. A síndrome de burnout é um exemplo de excesso de stress a nível laboral (Para ler mais sobre burnout, leia os nossos artigos aqui e aqui).

 

– Perturbação de Hiperatividade / Défice de Atenção (PHDA): Na PHDA, dificuldades na atenção, assim como problemas de hiperatividade e impulsividade, estão presentes desde a infância, chegando em 2/3 dos casos à idade adulta. Os problemas de atenção na PHDA acompanham a pessoa praticamente desde sempre, confundindo-se com quem ela é. Nas perturbações depressivas, perturbações ansiosas, nos problemas de sono e no stress, por outro lado, a pessoa desenvolve problemas de atenção apenas quando está doente. Quando não está deprimida, ansiosa, com défice de sono ou com stress excessivo, não tem queixas do domínio cognitivo.

 

– Demência: Na demência, tipicamente, défices cognitivos de vários tipos instalam-se de forma lenta e progressiva. Estes défices avançam até uma gravidade em que causam impacto significativo nas mais diversas atividades de vida diária – desde as mais complexas (usar o telemóvel, contar trocos, pagar contas, cozinhar refeições, etc.) às mais básicas (tomar banho, comer autonomamente, vestir sozinho, etc.). Embora haja exceções, as demências surgem em idades avançadas. O diagnóstico requer exames auxiliares de diagnóstico e deve ser feito por um médico psiquiatra ou um neurologista, com a ajuda de um neuropsicólogo.

 

O que devo fazer?

 

Se tem queixas se falta de atenção, o mais importante é perceber há quanto tempo estão presentes e se há outros sintomas paralelos. Deve procurar ajuda profissional para o ajudar a esclarecer a causa (ou as causas) das suas queixas – só é possível encontrar a solução certa quando o problema certo foi identificado.

Como nota final, deve ser notado que, neste artigo, apenas destacamos algumas causas de défice de atenção de origem mental e emocional. Cabe ao seu médico perceber se há outros problemas de origem física que possam estar a contribuir para os seus sintomas, como problemas hormonais ou neurológicos.

 

 

Fábio Monteiro da Silva –  Psiquiatra e Psicoterapeuta @ WeCareOn